JULGAMENTO

Família de Karoline Machado questiona conduta de juíza e do Ministério Público

Parentes e defesa afirmam que jurados votaram pela absolvição da acusada de envenenar o marido, mas votação foi repetida, e resultado mudou 

Por Iêva Tatiana

Publicado em 17 de janeiro de 2025 | 09:00

 
 
Karoline terá que cumprir pena de 16 anos em regime fechado, inicialmente Karoline terá que cumprir pena de 16 anos em regime fechado, inicialmente Foto: Arquivo pessoal

Após a condenação de Karoline Machado pelo Tribunal do Júri - quando o veredito compete somente aos jurados -, no último dia 9, familiares dela procuraram a reportagem de O Tempo Betim alegando que a juíza do caso interveio na decisão, fazendo com que uma absolvição se transformasse em condenação. A mulher é acusada de ter matado o companheiro, Dênis Carneiro, envenenado, em fevereiro de 2023.

Segundo o advogado de Karoline, Elias Ataíde, os sete jurados foram questionados sobre três quesitos: materialidade, autoria e absolvição. No primeiro e no segundo, a maioria respondeu “sim”, reconhecendo que a vítima morreu e que a ré é culpada pela morte. No terceiro quesito, foram registrados quatro votos favoráveis e três contrários à absolvição. O promotor de Justiça, então, interrompeu a votação, alegando haver contradição - já que os jurados atribuíam a autoria do crime à Karoline, mas a absolviam -, e solicitou uma nova votação, que foi acatada pela juíza, apesar da oposição da defesa. Na nova votação, o placar se inverteu, formando maioria pela condenação.

“A decisão dos jurados é soberana. Não cabia à juíza, naquele momento, pedir para votarem de novo. Quando ela fez isso, influenciou a cabeça dos jurados. Ou ao menos de um, que mudou o voto e foi a favor da condenação. Esse é o problema”, afirma Ataíde. “Karoline, que já estava absolvida, foi condenada em uma nova votação. É o trabalho da defesa, que está há dois anos nesse caso, jogado fora”, completa.

De acordo com o advogado, o questionamento do promotor deveria ter sido feito por meio de recurso apresentado posteriormente. “Não teve votação contraditória. Teve uma votação que o Ministério Público não aceitou, e a juíza acatou. Agora, a situação se inverteu: nós é que vamos ter que recorrer”, diz, ressaltando que um réu pode sim ser absolvido mesmo após ser considerado culpado. Ataíde adiantou que vai pedir a anulação do júri e apresentar um pedido de habeas corpus.

Parentes defendem inocência

A defesa e a família de Karoline, de 30 anos, afirmam que ela é inocente. Segundo o advogado, não seria possível ela ter cometido o crime do qual é acusada. Ele afirma, por exemplo, que, na denúncia, consta que ela ofereceu uma bebida envenenada a Dênis, enquanto o laudo da necrópsia aponta a presença de substâncias pedregosas (sólidas) no organismo dele. "Como ele ia tomar isso sem perceber?", questiona Elias Ataíde.

“A gente traz nossa indignação com o resultado do júri popular porque todo esse processo foi muito doloroso. Saber desde o início que a minha irmã foi presa sendo inocente, o amor que ela tinha pelo marido - e era recíproco -, saber que ela nunca faria isso com ele… Isso não acabou apenas com ela, mas com a família inteira”, diz a irmã, Bárbara Machado.

“É muito triste ver sua filha presa injustamente. Qualquer pessoa que estivesse passando por uma injustiça dessa não mereceria isso. É muito duro como mãe, mulher e ser humano. A justiça tem que ser feita da forma correta, como esperávamos que fosse, não daquele jeito”, emenda a mãe de Karoline, Diva Machado, referindo-se à segunda votação dos jurados.

Posicionamento

Em nota, o Tribunal de Justiça afirma que “o artigo 490 do Código de Processo Penal prevê a possibilidade de, no Tribunal do Júri, o magistrado repetir a quesitação (votar novamente quesitos) quando apresentadas respostas contraditórias”. O texto diz ainda que “a previsão legal existe, pois considera que os jurados são leigos e, eventualmente, podem se confundir durante a votação”. 

“A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que há contradição quando os jurados reconhecem a autoria delitiva, respondendo afirmativamente ao segundo quesito, e absolvem o acusado, nas situações em que a única tese sustentada pela defesa no plenário tenha sido a negativa de autoria. O caso em questão enquadrou-se exatamente nessa circunstância”, finaliza a nota.

O Ministério Público também foi procurado, mas, até a publicação desta matéria, não tinha se posicionado.