Motivo de fobia para uns, objeto de afeto para outros. As cobras podem até não ser uma opção óbvia quando se pensa em animais de estimação, mas elas têm “ocupado o lugar” de gatos e cachorros em muitos lares Brasil afora. Além de fazer companhia, elas também movimentam o mercado. Só no criatório Jibóias Brasil, localizado em Betim, região metropolitana de Belo Horizonte, o biólogo e empresário Tiago de Oliveira fatura R$ 1 milhão por ano com a venda de jiboias e jiboias arco-íris. Segundo ele, trata-se do maior criatório especializado neste tipo de animal da América Latina.
“As cobras têm atraído compradores principalmente pela praticidade, pois dão pouco trabalho e gostam de ficar mais reclusas, facilitando a saída dos donos sem preocupação. Também são animais que não transmitem doenças, o que gera pouco gastos com veterinários. A procura tem crescido”, afirma.
Apesar de não haver números específicos sobre a venda de cobras no país, a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet) e o Instituto Pet Brasil (IPB) estimam que o número de répteis de estimação subiu de 2,6 milhões, em 2022, para 2,8 milhões, em 2023, uma alta de 7,6% em um ano.
O empresário conta que as vendas são realizadas de forma online e os animais são comprados ainda filhotes, geralmente a partir dos quatro meses de idade, o que facilita o manejo e convivência. Já o custo para se adquirir uma jibóia não é exatamente baixo, com preço médio que varia de R$ 2.500 a R$ 10 mil. Ele já chegou a vender um animal por R$ 20 mil - preço máximo alcançado na loja.
“Algumas espécies se reproduzem mais, outras menos. Quanto mais raro, mais caro. O cliente também precisa fazer um investimento inicial para a construção do terrário, pois a cobra não pode ser criada solta dentro de casa. O custo fica entre R$ 1.500 e R$ 3 mil, dependendo dos materiais usados.”
Baixo custo de manutenção é um dos fatores que atraem os compradores de cobras. Foto: Fred Magno/O Tempo
Quem tem ajudado esse mercado a crescer é a bióloga Paula Grivielli, de 42 anos, que tinha um sonho antigo de criar cobras e, só neste ano, adquiriu três: Cookie, Dolores e Hoppe. Segundo ela, a praticidade e a fácil manutenção foram realmente determinantes. “Já tive uma cachorrinha, que ficava ansiosa quando não havia pessoas na casa, e um mini bode, que fazia barulho. As cobras são silenciosas e ficam bem sozinhas”, relata.
Mãe de duas crianças, Davi, 9, e Rafael, 6, ela também conta que os animais exóticos têm ajudado os pequenos a desenvolverem habilidades emocionais. “Além do senso de responsabilidade, como limpar o terrário e colocar comida, eles também aprendem sobre compaixão. Uma das cobras, o Hoppe, é cega dos dois olhos e tem algumas limitações. É bacana ver como os meninos têm empatia com as limitações dela”, reflete.
Outro motivo que explica a busca deste animal como pet é o baixo custo com alimentação. Segundo Tiago, quando são filhotes, as jiboias se alimentam a cada dez dias. Na idade adulta, comem a cada 30 dias - prazo que pode chegar a dois meses. O “lanche” das jiboias é composto principalmente de ratos congelados e oferecidos pela empresa aos clientes.
"As cobras ensinam as crianças sobre responsabilidade e empatia", garante uma das clientes deste mercado. Foto: Fred Magno/O Tempo
“Um roedor custa de R$ 4 a R$ 30 a unidade. Considerando que um animal adulto come pouco, o custo é baixo. A expectativa de vida das cobras também é alta. Em média, esse tipo de animal vive de 20 a 25 anos, podendo chegar a 40 anos de idade. O cliente investe em um animal que vai viver por muito tempo”, diz.
Paula concorda e dá um exemplo prático de como tem gastado pouco com seus animaizinhos. “Costumo alimentá-los uma vez por semana, pois ainda são filhotes. Parece muito, mas minha última compra de ratos custou R$ 60 e vai ser suficiente para dois meses. Considerando que tenho três animais em casa, é muito barato.”
Não são apenas as cobras que fazem sucesso entre os amantes de pets “não convencionais”. Na lista de bichinhos queridos também estão as aves, como papagaios e araras, e os roedores, como porquinhos da índia e os ratos twister. Ronaldo Torres, gerente da Ezootique, loja de animais exóticos e silvestres em Belo Horizonte, afirma que esses são justamente os animais mais procurados na loja.
“Os ratos são muito interativos. Se o dono tiver paciência, eles aprendem até alguns truques. Também têm um custo relativamente baixo, podendo custar entre R$ 80 e R$ 100. A única questão é que vivem pouco, cerca de três anos, e não gostam de ficar sozinhos. Então, sempre aconselho o cliente a comprar mais de um”, explica.
De acordo com a Abinpet e com o IPB, o número de pássaros silvestres subiu de 41,6 milhões, em 2022, para 42,8 milhões em 2023, (alta de 3%). As aves ornamentais foram de 41,6 milhões para 42,8 milhões (alta de 3%) e os pequenos mamíferos aumentaram de 2,6 milhões para 2,8 milhões (alta de 7,6%) no mesmo período.
É preciso estudar sobre os animais antes da compra para evitar abandonos, alertam especialistas. Foto: Fred Magno/O Tempo
A loja de BH tem acompanhado o crescimento nacional. O negócio tem crescido cerca de 20% ao ano e, só em novembro, o faturamento ficou na casa dos R$ 110 mil. “Pretendemos crescer mais a partir de 2025. Oferecemos cerca de 16 espécies e, quando conseguirmos aumentar esse mix, estimamos um crescimento na casa dos 25% ao ano”, diz.
Apesar de comemorar o crescimento do mercado, Ronaldo alerta que é preciso cautela antes de sair adquirindo um bichinho. “É preciso saber as características comportamentais, hábitos alimentares e preços para não se arrepender depois. Nesse ponto, o alto preço de alguns animais coíbe as vendas por impulso. Já vendemos uma cacatua por R$ 32 mil. Quem realiza uma compra desse porte geralmente já está preparado para cuidar”, diz.
Os profissionais também são unânimes ao recomendar a compra responsável, para não correr o risco de adquirir animais vítimas de tráfico ou maus tratos. A única forma de possuir um animal silvestre legalizado é adquirir o animal de um criadouro ou estabelecimento comercial autorizado. Antigamente, a permissão era feita pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Mas, agora, elas acontecem via órgãos estaduais. Em Minas Gerais, quem autoriza esse tipo de venda é o Instituto Estadual de Florestas (IEF).
O cliente também deve exigir a nota fiscal contendo espécie e marcação do animal e certificado de origem com a mesma espécie e marcação da nota fiscal. Clique aqui para checar a autenticidade do certificado de origem.
“O Ibama também disponibiliza um link para a verificação do certificado de origem através de leitura de QR Code. Isso evita que os clientes comprem animais com certificados falsos”, alerta Tiago.