RARIDADE

Memórias cunhadas: moedas e notas carregam lembranças colecionadas nas últimas décadas

Acervos guardam histórias reunidas pelas famílias de João Bosco e Iran Braga, betinenses ouvidos pela reportagem

Por Marcio Antunes

Publicado em 02 de outubro de 2025 | 18:53

 
 
João Bosco de Miranda, de 62 anos, começou a guardar moedas e cédulas há cerca de quatro décadas João Bosco de Miranda, de 62 anos, começou a guardar moedas e cédulas há cerca de quatro décadas Foto: Carolina Miranda

Moedas e notas que já não circulam mais como dinheiro seguem desempenhando outro papel: o de contar histórias. Em Betim, dois moradores mantêm viva essa tradição de colecionar peças antigas, cada um à sua maneira, revelando que guardar um objeto pode significar muito mais do que preservar seu valor material.

O primeiro deles é João Bosco de Miranda, de 62 anos. Ele se lembra de ter começado a guardar moedas e cédulas há cerca de quatro décadas, sem imaginar que aquele hábito despretensioso se transformaria em uma coleção. “Jamais pensei em coleção. As notas e as moedas estavam perdendo valor. Junto moedas que passaram por mim”, diz. Hoje, ele não sabe precisar quantas peças já acumulou, mas garante que o mais importante não é a quantidade, e sim a memória que cada uma carrega. 

Além das moedas, João Bosco guarda outros itens antigos, como máquina de costura e ferro de passar, objetos que remetem a um tempo em que a vida tinha outro ritmo. Entre as raridades da sua coleção, está uma moeda de R$1 vendida por R$300. “Ela tem no anverso uma referência ao cinquentenário da declaração universal dos Direitos Humanos. Esta moeda é uma moeda rara porque foram cunhadas apenas 600.000 unidades. Mas, para ele, não é o dinheiro que importa. “Minha intenção não é ganhar dinheiro com essas moedas. Eu quero guardar para manter na memória a história por trás delas”, explica.

O acervo de João Bosco traz peças marcantes, como moedas das Olimpíadas do Rio, em 2016, e exemplares do tempo do Império, quando a moeda em circulação era o Conto de Réis. Ele gosta de pensar que algumas dessas peças podem ter passado pelas mãos de Dom Pedro II. Entre moedas estrangeiras vindas da Turquia, Egito, Emirados Árabes, Dubai, Alemanha, China, Cuba, Portugal, Japão, Austrália e Canadá. Ele garante que o foco são as nacionais. Ele também tem em sua coleção dezenas de cédulas antigas, que também ajudam a contar a história do dinheiro ao longo dos últimos anos. 

Para avaliar se uma moeda pode ser considerada colecionável, ele se atenta a critérios como a quantidade de unidades fabricadas, o local de cunhagem e a estética da peça. Ainda assim, ele insiste em não se ver como um colecionador típico: “Não faço prospecção de moedas. Eu junto porque, por algum motivo, elas passaram por mim e resolvi guardá-las. Defeitos de cunhagem também fazem dela uma peça rara”, explica. 

Memórias de família 

Iran Braga da Costa, de 38 anos, servidor público e metalúrgico, encontrou nas notas e moedas uma forma de manter viva a memória da mãe, Amália Braga, falecida há cinco anos. Morador do bairro Bom Repouso, ele conta que herdou dela a coleção de notas e cartões. “Minha mãe colecionava notas e cartões. Eu acabei pegando gosto e, depois que ela se foi, passei a incluir novos itens à coleção”, relembra.

Hoje, o acervo reúne cerca de 150 notas e 30 moedas de diferentes países. A filha de Iran, Giovana, também já deixou sua marca nessa história: quando ainda era criança, disse que queria conhecer a França. Para incentivá-la, ele deu a ela uma moeda árabe. “Queria que ela tivesse uma noção do tamanho do mundo em que vivemos”, explica.

Entre lembranças de família e peças históricas, Iran reforça que sua relação com os objetos vai além da coleção em si. “Sou um cara apaixonado pela história em geral. Itens da minha mãe, da minha avó, eu fiz questão de guardar. Tenho muita coisa herdada porque eu tenho sentimento pelo objeto e pela história dele. Eu costumo dizer que sou um guardião de nossas lembranças.” Para ele, guardar uma nota ou moeda é como carregar consigo parte da própria história. “Hoje em dia não é tão comum as pessoas terem apego aos objetos antigos”. 

Entre a coleção espontânea de João Bosco e a herança afetiva de Iran, as moedas e notas guardadas por eles carregam algo que vai além do metal e do papel. “Para mim, essas peças fazem parte da minha e da história da minha família”, completa Iran da Costa.