AUTONOMIA E INCLUSÃO

Projeto ‘Ler para Ver’ leva leitura a pessoas com deficiência visual

Ação permite que livros em braille sejam entregues na residência dos leitores

Por Lisley Alvarenga

Publicado em 07 de novembro de 2025 | 09:00

 
 
De agosto pra cá, Elizabete Colares, do Vila Cristina, já leu 18 livros por meio do projeto Braille Delivery De agosto pra cá, Elizabete Colares, do Vila Cristina, já leu 18 livros por meio do projeto Braille Delivery Foto: Brandon Santos

Quando chegam os fins de semana, o casal Elizabete e Luiz tem um hábito milenar que virou parte da rotina: sentar juntos na sala para ler. Sobre o sofá, ficam dois livros em braille. Logo, os dois começam a percorrer as páginas com os dedos, concentrados na leitura. Muitas vezes, eles trocam comentários sobre a história. Em outros momentos, apenas dividem o sossego de quem lê junto: cada um com seu livro, mas ambos na mesma sintonia.

“Agora a gente lê juntos, sentados na sala. Ela com o livro dela, eu com o meu. Depois conversamos sobre o assunto do meu livro ou do dela e permanecemos em paz na nossa leitura”, conta o bibliotecário Luiz Carlos da Silva, de 62 anos. Morador do bairro Vila Cristina, ele é um dos participantes do projeto “Ler para Ver – Braille Delivery”, lançado em agosto pelo governo de Minas. 

Ao lado da esposa, a dona de casa Elizabete Colares da Silva, de 50 anos, eles transformaram a sala de casa em um pequeno espaço de leitura e convivência. “É muito gratificante participar desse projeto, porque eu gosto muito de ler. Desde menina, sou apaixonada por livros, e o fato de poder recebê-los em casa facilita demais. O livro em braille é pesado, às vezes tem dez ou 15 volumes, e nem sempre conseguimos alguém para buscar. Agora, com o projeto, é só esperar o toque na porta, e a leitura chega até nós”, conta ela.

O Braille Delivery nasceu por meio da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult-MG) e da Secretaria de Governo de Minas. A proposta é simples, mas transformadora: levar livros em braille e audiolivros gratuitamente até pessoas com deficiência visual ou baixa visão que moram em Belo Horizonte e em cidades da região metropolitana, como Betim, Contagem, Nova Lima e Matozinhos.

De acordo com o coordenador do Setor Braille da Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, Glicélio Ramos Silva, a ideia do projeto surgiu da necessidade de superar as dificuldades de locomoção enfrentadas pelos leitores. “O livro em braille é volumoso e pesado, e nem sempre há transporte público adequado. Então pensamos: por que não levar a leitura até eles? Assim nasceu o Braille Delivery”, explica o coordenador. 

Em expansão

Os números refletem o sucesso da iniciativa. Em agosto, quando a ideia foi lançada, foram realizadas sete entregas e 11 títulos emprestados. Em setembro, nove entregas e 17 títulos. Já em outubro, o número cresceu ainda mais: 17 entregas e 34 livros emprestados. No total, até o momento, foram 45 entregas e 90 títulos emprestados a leitores de quatro municípios. Somente em Betim, foram 19 obras emprestadas a três moradores. O acervo disponível para o delivery reúne cerca de 1.800 livros em braille e 2.500 audiolivros, com obras de autores como Harper Lee, Dostoiévski, Pablo Neruda, Alexandre Dumas Filho, Leila Ferreira e Clarice Lispector.

A experiência de Elizabete e Luiz comprova o impacto da ação. Desde agosto, eles leram, juntos, 18 livros, entre eles “A Dama das Camélias”, de Alexandre Dumas Filho, “Depois de Você”, de Diana Scott, “O Sol é para Todos”, de Harper Lee, e “Hilda Furacão”, de Roberto Drummond. “Eles são muito pontuais, o atendimento é excelente. Entregam direitinho, vêm buscar, renovam os livros. São muito atenciosos”, elogia Elizabete. Luiz Carlos, por sua vez, vê no projeto uma forma de fortalecer o hábito da leitura entre as pessoas com deficiência visual. “O transporte público está cada vez mais difícil. As pessoas moram longe, o deslocamento é cansativo. A ideia de levar o livro até o deficiente visual é algo lógico, porque facilita muito. Quem gosta de ler vai gostar ainda mais”, salienta ele.

De acordo com Gildete Veloso, coordenadora do Núcleo de Extensão da Biblioteca Pública Estadual, o “Braille Delivery” garante mais do que acesso: promove autonomia. “Pessoas cegas ou com baixa visão têm dificuldades que comprometem a formação, o lazer e a inclusão social. Esse trabalho garante autonomia aos leitores e amplia o alcance da política pública de cultura”, destaca a coordenadora. 

Como funciona

Para participar do projeto Braille Delivery, o interessado deve se cadastrar enviando cópia do RG, comprovante de residência e, no caso de baixa visão, atestado médico para braille.sub@gmail.com ou pelo WhatsApp (31) 98675-0251.

O empréstimo é de até três livros em braille ou cinco audiolivros por 14 dias, com renovação e devolução também em domicílio. A renovação pode ser feita por igual período, com pedido feito pelo WhatsApp (31) 98675-0251 ou pelo telefone (31) 2128-8248.

As entregas ocorrem de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h, em Belo Horizonte e nas cidades da região metropolitana localizadas a um raio de 70 km da capital.