SINGULARES

Doenças raras, desafios em comum

Diagnóstico e tratamento são primeiros obstáculos de pacientes

Por Iêva Tatiana

Publicado em 07 de dezembro de 2025 | 09:00

 
 
Cledemar Duarte nasceu com um dedo da mão excessivamente grande Cledemar Duarte nasceu com um dedo da mão excessivamente grande Foto: Brandon Santos

Descobrir uma doença ou uma condição incurável é impactante. Quando se trata de um caso raro, o desafio é ainda maior, já que ele comumente vem acompanhado de diagnóstico tardio, tratamento dispendioso e dificuldade para encontrar profissionais especializados. Essa foi justamente a saga vivida pelo publicitário Anderson Santos, de 39 anos. Desde a adolescência, ele sentia um sono incontrolável – já dormiu apresentando trabalho na faculdade, dirigindo, assistindo a uma partida de futebol e até em pé em um show no Rock in Rio. Somente aos 27 anos, o publicitário confirmou suas suspeitas de que havia algo errado e, enfim, teve uma resposta: narcolepsia.

Trata-se de um distúrbio do sono que afeta cerca de 25 a 50 pessoas a cada 100 mil habitantes no mundo e costuma se manifestar entre os 15 e os 20 anos de idade, segundo o neurologista Camilo Azeredo, responsável pelo diagnóstico de Santos. O principal sintoma é a sonolência diurna excessiva. Alguns pacientes também podem apresentar perda de controle do tônus muscular, resultando em quedas e perda momentânea de consciência; e paralisia do sono, situação em que a pessoa desperta, mas não consegue se mover, ficando em um estado de “congelamento”. 

“A narcolepsia é uma condição que demora muito para ser diagnosticada. Às vezes, o paciente passa por vários profissionais para descartar deficiência de vitaminas, questão hormonal ou problema de ordem de humor (como depressão grave) até chegar a um neurologista ou especialista do sono. Leva-se, em média, dez anos para se obter o diagnóstico. Como é uma doença rara, ela ainda é pouco estudada e falada”, frisa o médico.
Azeredo também chama a atenção para outro aspecto do distúrbio: as dificuldades encontradas pelos narcolépticos em atividades corriqueiras. “O excesso de sono traz dificuldades de relacionamentos, de se manter em um ambiente de trabalho e prejuízos acadêmicos. A narcolepsia, quando não tratada, causa danos muito grandes aos pacientes”, diz.

Santos acrescenta: o distúrbio afeta também a família e o círculo social de quem tem a doença. “Quando a gente vai crescendo, isso é mais constrangedor porque muita gente acha que você passou a noite na farra. Já levei broncas de chefe por causa disso. Fui chamado de preguiçoso e, mesmo falando que não era baladeiro, não conseguia explicar aquele sono todo”, relembra. “O diagnóstico não traz alívio nesse sentido, mas entrega, mesmo que tardiamente, algumas respostas e explicações”, emenda o publicitário.

Ainda mais raro

No caso do repórter de esportes do O TEMPO Betim, Cledemar Duarte, de 34 anos, o diagnóstico foi precoce, mas também trouxe desafios, sobretudo por se tratar de uma anomalia visível, com efeitos na autoestima, principalmente na infância e na adolescência. O jornalista tem macrodactilia, uma alteração congênita que resulta no crescimento excessivo de um ou mais dedos da mão ou do pé em decorrência de uma mutação genética. Dados do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos apontam que, a cada 100 mil nascidos em todo o mundo, um tem essa condição rara.

O cirurgião de mão e microcirurgias Tailsom Nunes pontua que a macrodactilia impacta não apenas a estética, mas a funcionalidade do membro afetado, “dificultando a realização de atividades diárias e também o desenvolvimento social”. “Os dedos podem ser longos, largos, rígidos ou curvos. Em alguns casos, pode haver associação com outras alterações congênitas, a exemplo da sindactilia, que é a fusão de dois dedos”, afirma o médico, que acompanha Duarte.

Entre as opções de tratamento, o cirurgião lista o desbastamento para remover o excesso de tecido mole do dedo; as cirurgias para corrigir deformidades e outros métodos para diminuir o tamanho do dedo; a limitação do crescimento por meio do bloqueio da cartilagem; a melhora do contorno da ponta do dedo para corrigir a aparência; a transferência de um dedo do pé para a mão, indicada em casos graves, por se tratar de uma cirurgia complexa; e a amputação, em casos severos, removendo o dedo ou parte da mão para melhora da função.

Esse último procedimento foi realizado parcialmente em Duarte quando ele tinha apenas 2 anos. Aos 12, ele foi submetido a uma nova cirurgia para a retirada de excesso de gordura na palma da mão. Nesta semana, ele fez a amputação total do dedo médio para sanar dores e melhorar a mobilidade. O repórter conta que protelou essa intervenção por achar “normal” o desconforto que sentia. “Nos últimos anos, comecei a cuidar mais da minha saúde e a compreender melhor as dores que sinto”, diz o jornalista, lembrando que a macrodactilia já foi uma condição muito difícil de lidar. “Na infância, eu sempre colocava a mão no bolso e tentava escondê-la. Na adolescência, me constrangia ao me aproximar das garotas”, relembra, ressaltando que o foco agora é “viver melhor”.