Na minha última crônica, falei do sofá que despencou de um caminhão na frente do meu carro em pleno Anel Rodoviário.
Pois é. Acreditem que anteontem um motoboy, surgido do nada, atravessou pela direita, obrigando-me a jogar o carro no canteiro central da rua? Foi um “bum” que nunca ouvi antes na vida. O pneu não furou, ele explodiu! E como desgraça pouca é bobagem, com o impacto, o vidro da janela caiu. Nessas alturas, o sujeito sumiu com sua moto num ziguezague tresloucado, como se estivesse fugindo da polícia. “Será porque viu a m... que fez?”, pensei, enquanto descia do carro para ver o tamanho do estrago.
O calor estava de fritar ovo no asfalto, meio carro pendurado na rua movimentada, com o pneu estourado e o vidro desaparecido nas entranhas da porta. Sim, o próprio filme de terror, narrado em pormenores ao meu sobrinho, convocado às pressas para me tirar dessa. Um super-herói! Que só não morreu desidratado porque apareceu um santo vendendo água no isopor.
Não tive nenhuma culpa nessa história, mas em compensação, outro dia, um homem acabou comigo. Pudera! Fiz a maior barbeiragem do planeta. À frente do meu carro, tapando minha visão e o semáforo (diga-se de passagem), um caminhão do tamanho de um edifício. O tráfego era intenso, e o ritmo, acelerado. E eu lá, correndo atrás do “edifício”. Ao olhar distraída para o sinal à esquerda, vejo-o amarelo. Por impulso, resolvo frear de repente. Problema: o tal semáforo era destinado a quem fosse fazer a conversão, e não a quem prosseguisse em linha reta, como era o meu caso e dos outros 200 carros que vinham atrás. Pronto, já viram o tamanho da encrenca. Escuto uma sequência de “nhrrreee! nhrrrrreee! nhrrrrrreeee!” Por muito pouco me safei do BUM! Eu e os 200 carros. A vergonha foi tanta que nem quis olhar pelo retrovisor. Acelerei e saí rapidinho.
E não é que o motorista de trás, taxista, injuriado com meu “lapso automotivo”, fez questão de me seguir por três quarteirões? Exclusivamente para me detonar?
– ÊÊÊÊÊÊÊ, MULHER!!!! P.Q.P...iuuuuuuuu! #%@#*#@!!!
Por pouco não bate no carro da frente, afinal, só tinha olhos (e boca) para mim. Xingava, gesticulava, xingava de novo... E eu na minha. Com um gesto, pedia calma e desculpas. Acontece, né? Tentei explicar com um sorrisinho tímido. Que nada! Nada de desculpas.
Devo ter sido a melhor terapia de sua vida, pois descarregou em mim, de uma vezada só, todas as suas frustrações, raivas, ódios reprimidos e por aí vai.
A-DO-RO dirigir! E, modéstia à parte, muito bem (a besteira aí de cima foi uma exceção em dia de distração). Claro que nesses mais de 30 anos de estradas (e buracos) já passei por algumas dificuldades como capotamentos colossais, árvore caindo no capô, sofá pulando na frente do carro, velho pelado no meio da estrada jogando pedras em meu vidro, fios de alta-tensão despencando no veículo e coisas do tipo. Costumo dizer que meu anjo da guarda deve estar exausto. Isso para não falar do desconforto de praticamente “morar” dentro do meu carro. Fazer o quê? Não tenho culpa de essas coisas acontecerem.
Como diz o ditado, quem está na chuva é pra se molhar. E, cá pra nós, guiar em Belo Horizonte é viver em constante “tormenta”. Como diz o matuto: “Êta lugarzinho ruim de dirigir, sô!” Primeiro: o povo é lerdo. Muuuito lerdo. O sinal abre e até o sujeito se dar conta já fechou de novo. Outra coisa, já repararam como justamente os mais lerdos ADORAM andar na esquerda, empacando o trânsito? E como ODEIAM dar passagem? Obrigando o de trás a piscar o farol, dar uma buzinadinha ou, em casos extremos, uma buzinadona (que é proibido), implorando a passagem que lhe é devida? Não, não vou escrever aqui que em determinadas situações, após todas as tentativas frustradas, o motorista é obrigado a ultrapassar pela direita, porque isso também é errado e pode me causar confusão. Quem dirige em Belo Horizonte sabe do que estou falando.
Mas, como ia dizendo, fora os transtornos externos, independentes da minha vontade, em tantos anos de estrada nunca causei acidentes ou batidas. Minto. No primeiro ano de casada, dando uma ré, consegui trombar dentro da própria garagem. Detalhe: no carro do meu marido – dois prejuízos de uma vezada só. Pelo menos não tive que chamar a perícia.
E por falar em casa, há mais de 30 anos, uma eficientíssima caminhonete D20 (quase um caminhão) me quebra todos os galhos possíveis: remoção de material de jardim, transporte de material de construção, recicláveis, doações para bazares etc., etc. Não fica parada um minuto. Atenção: refiro-me a uma caminhonete balzaquiana, enoooorme, quase um caminhão branco, desbotado e surrado. Nada que chegue perto das atuais e bacanérrimas caminhonetes que andam por aí: caríssimas e potentíssimas, como as Cherokees e as famosas Land Rovers.
Nada parecido, mas também nada que deixe a desejar. Não sei se devido ao meu inconsciente complexo de baixinha, ADORO dirigi-la. Estar lá no alto é muito bom! Cara a cara com aqueles ônibus atrevidos que normalmente nos jogam para escanteio. Só tem um porém: enquanto estou no volante, dirigindo aquela coisa desproporcional ao meu tamanho, acabo virando “atração”. Percebo claramente os risinhos e o espanto, principalmente dos motoristas ao lado. Sempre eles. Os homens.
Outro dia fiz besteira (minha listinha só vai aumentando, né?).
Distraidíssima, com o carro debaixo do lava a jato, aquela coisa cheia de espumas, águas e esfregões, senti calor e resolvi abrir o vidro. Nunca ri tanto com uma desgraça – eu e os dois frentistas que presenciaram a cena. Até hoje, quando vou abastecer, vejo os dois me olhando. E rindo, naturalmente.
Pior mesmo foi o que aconteceu com uma amiga. Incomodada com o motorista à sua frente, buzina. E o sujeito, incomodado com sua buzina, grita: “Passa por cima!” E ela, seguindo ao pé da letra a sugestão, passou. Não por cima, mas quase. Por pouco não morre estrangulada, e sua história, transcorrida no caótico trânsito de BH, foi parar na delegacia. Culpados? Os homens, claro! Sempre os homens.