OPINIÃO

Cavando derrotas

Quem está com propósitos de suprimir ou varrer do meio da sociedade alguém amado e de muitas formas útil deve prestar atenção, pois a vítima costuma elevar-se em alturas celestiais inalcançáveis

Por Vittorio Medioli

Publicado em 11 de março de 2024 | 19:10

 
 
O escritor George Gazette, citado por Bhagwan Shree Rajneesh, sustenta que Jesus planejou sua crucificação O escritor George Gazette, citado por Bhagwan Shree Rajneesh, sustenta que Jesus planejou sua crucificação Foto: Reprodução do Wikipédia
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Colunista de Opinião
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Se Jesus não tivesse sido crucificado, o mundo o teria esquecido há muito tempo. De certo modo, a perseguição foi benéfica para Jesus. O escritor George Gazette, citado por Bhagwan Shree Rajneesh, sustenta que Jesus planejou sua crucificação. Ele quis ser crucificado – afirmou – porque, assim, todas as palavras que havia já pregado se tornariam a verdade viva por séculos e seriam benéficas a milhões de pessoas. 

Mesmo improvável, isso é possível. Judas, que vendeu Jesus por 30 moedas, foi um dos seus discípulos mais amados. Parece inacreditável que alguém que passou tantos anos com Jesus fosse vendê-lo por uma quantia qualquer. Assim poderia, segundo George Gazette, ter sido o próprio Jesus a encorajá-lo a fazer que mudasse de lado e organizasse a conspiração, a fim de que a doutrina por Ele divulgada pudesse ganhar impulso, atravessar oceanos e se tornar a estrela-guia de bilhões de pessoas. 

A morte violenta de Gandhi, outra pessoa de bem infinito, o consagrou como o maior líder da Índia. Ganharam asas a fama e o exemplo de Martin Luther King, de John Fitzgerald Kennedy e vários outros que encontraram na morte violenta, e aparentemente injusta, a força para ultrapassar os limites de um mero mortal. 

O homem muçulmano que atirou em Gandhi e o matou não poderia ter tido tanto sucesso em prolongar a memória do líder indiano; deu uma imensa contribuição para multiplicar os efeitos e eternizar seu legado. 

Ao assassinar um líder amado pelas multidões, apenas colabora-se para ele se tornar imortal. 

Quando o veneno estava sendo preparado para Sócrates ser executado, alguns dos seus discípulos questionaram como seu corpo deveria ser tratado após a morte. “Deve ser cremado, enterrado ou o quê?”, eles perguntaram. Sócrates riu e disse: “Homens simplórios! Ninguém será capaz de me enterrar. Viverei até mesmo quando todos vocês não estiverem mais vivos. O segredo é que eu preferi morrer apenas para viver para sempre!” 

Portanto, quem está com propósitos de suprimir ou varrer do meio da sociedade alguém amado e de muitas formas útil deve prestar atenção, pois a vítima costuma elevar-se em alturas celestiais inalcançáveis, e os perseguidores afundam-se nas baixezas mais sombrias. 

Em política, o ódio e a perseguição não são vistos pela maioria de bons olhos. Especialmente por parte daqueles que, investidos do maior poder, extrapolam os limites e apelam a tudo para constranger, amedrontar e ceifar adversários. 

As forças universais, a justiça cósmica invisível, que atuam sem pressa, se cumprem inexoravelmente. Os jacobinos, que na Revolução Francesa criminalizaram os adversários apenas por pertencerem a uma categoria ou classe social, ao acionarem as guilhotinas, não pensaram que eles mesmos em pouco tempo e nos mesmos patíbulos perderiam a cabeça. 

As forças invisíveis costuram em silêncio as reações –inversamente proporcionais aos horrores cometidos. Os sinais podem ser vistos com bastante antecedência, pois nada acontece de uma só vez, e quem observa com atenção pode enxergá-los muito antes. 

Vejam-se as pesquisas que sondam os humores eleitorais da população brasileira: estão, neste momento, indo no sentido contrário das ações que querem tirar do páreo adversários de todas as formas e que forjam um vocabulário de aparência  democrática. 

As pesquisas das últimas duas semanas detectam um crescimento da importância de Bolsonaro nos pleitos municipais de 2024, exatamente após ele ter se tornado inelegível e a um passo de ser preso. Como em outras fases da história, certas ações provocam reações inversamente proporcionais. 

Como disse Rajneesh, “as pessoas chamadas de ‘poderosas’ estão brincando com as emoções do mundo” e, para enterrar adversários, cavam as próprias fossas.