OPINIÃO

Dos humildes é o reino

O grande Mestre Jesus deu explicação para quem se interessar: 'Deixai os meninos, e não os estorveis para vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus'

Por Vittorio Medioli

Publicado em 05 de maio de 2024 | 10:15

 
 
Leia a coluna de Vittorio Medioli, 'Dos humildes é o reino' Leia a coluna de Vittorio Medioli, 'Dos humildes é o reino' Foto: Foto: REPRODUÇÃO
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
Colunista de Opinião
Vittorio Medioli Vittorio Medioli
aspas

Faz parte do “normal” esquecer que um dia fomos crianças, jovens e que tudo mudou por dentro e por fora, como se tivéssemos deixado uma casca e seu conteúdo, um invólucro sem utilidade, uma roupa velha. 

A personalidade do indivíduo, com o decorrer do tempo, passa a ser totalmente diferente naquilo que pensa, age e reage para continuar a sobreviver.

Quase todas as lembranças são tragadas por não serem mais úteis, somem no ralo aberto para deixar espaço a mais recentes experiências, desejos, necessidades, preferências, interesses.

Algumas poucas lembranças resistem nítidas e incorruptíveis, como se fossem esculpidas numa lápide. O resto, como fumaça, o vento leva. Se alguma fica, despenca no fundo de um baú aparentemente inacessível em estado de normalidade. Psicanalistas, entretanto, afirmam que em estado de hipnose profunda as reminiscências emergem de um arquivo “morto” dentro do ser humano.  

Compreender a razão de permanência de imagens fotográficas fixadas no repositório mental ainda ativo continua a ser um enigma para a ciência. 

Podemos, talvez, deduzir que repescar conscientemente fatos e imagens da juventude se deve não à capacidade psíquica preservada, mas às circunstâncias em que esses eventos se fixaram como imagens, sentimentos, perfumes e detalhes nítidos. 

Isso é devido à capacidade de percepção juvenil, menos condicionada e envelhecida (ou curtida) nas andanças da existência que antecedem a maturidade. O ditado de que o primeiro amor nunca se esquece tem ligação com essa sensibilidade incontaminada?

Contudo, não resta dúvida de que os sentimentos profundos de admiração, de incredulidade e de amor, que se acompanham de felicidade, interesse e prazer, enriquecem o sistema interior do homem e marca a subida de degraus, assim como pode deixar cicatrizes indeléveis.

A permeabilidade da personalidade, dita de neutralidade, deixava entrar raios de luz e fixava como numa película fotográfica mental o momento, tornando-o inesquecível em nível de compreensão.

Se a ciência não concede uma explicação para esses fenômenos, como de resto para quase tudo que fica fora das quatro linhas do materialismo, encontramos resposta nos adeptos da “ciência” do yoga oriental. 

Eles afirmam que alguns relâmpagos de acesso aos poderes superiores do homem, que dependem de virtudes próprias da inocência e pureza de espírito, seriam exatamente as razões de compreensão e de fixação lúcida de experiências. 

A pureza, a ausência de maldades, o egoísmo não desenvolvido, o interesse não condicionado, o amor puro, permitem o acesso a essas condições superiores de entendimento, sem cortinas e filtros. 

O que se segue à primeira idade da existência introduz a pequenez do egoísmo, as lutas sem fronteiras, a insana disputa pelo dinheiro, fecham-se todas as portas às virtudes e à permeabilidade interior, que faz compreender os mecanismos de vida.

Yoga significa união. União liga dois pontos distantes. Retirar do meio o que separa os pontos provoca o retorno consciente do homem às suas origens de integridade, pureza e beleza.

O grande Mestre Jesus deu explicação para quem se interessar: “Deixai os meninos, e não os estorveis para vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus”.

Ainda: “Se não vos converterdes e não vos fizerdes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus... Quem se tornar humilde como esta criança, esse é o maior no reino dos céus... Qualquer um que receber em meu nome uma criança tal como esta, a mim recebe... Quem fizer tropeçar um destes pequeninos que creem em mim, melhor seria que se lhe pendurasse ao pescoço uma pedra de moinho, e se submergisse na profundeza do mar”. 

A vida, segundo o yoga, serve para retornar às virtudes de pureza original dentro de uma personalidade expandida, ampliada e vitoriosa, como é o universo – livre de amarras.