As agências internacionais de notícias informam a morte de 25 pessoas durante a repressão aos movimentos de rua que contestam a “vitória” eleitoral de Nicolás Maduro sobre seu adversário – com supostos 52% dos votos válidos.
A proclamação do resultado ocorreu por meio do CNE – um equivalente ao TSE brasileiro –, sem dar a menor transparência dos dados ou acesso aos relatórios de apuração.
Os venezuelanos, segundo o reeleito Maduro, têm que acreditar que ele ganhou legalmente, apesar de o país se encontrar destruído e seu povo, desempregado, esfomeado e sem liberdade. Ou seja, o inverso do que se materializa em democracias de verdade, mergulhadas em situações semelhantes, com inúmeros e graves motivos para desejar o fim de um governo falido, desastroso e ditatorial.
Maduro está se decompondo, mas pretende que se acredite e se aplauda sua vitória, não pela transparência dos dados, mas pela fé e respeitabilidade de um órgão que tem a escolha e a nomeação decididas apenas por ele. Típico exemplo daquilo que notáveis brasileiros afirmam: “Eleição não se ganha, se toma”.
Os mortos evidentemente confirmam o desespero, de um lado, e a truculência sanguinária, do outro. Mais do que uma queda de braço – uma previsão afirmada por Maduro –, “será um banho de sangue”.
Em outros países a derrota eleitoral não justifica uma gota de sangue, quanto mais o banho antevisto, que já começou. Em pleno século XXI, trata-se da resistência sanguinária a aceitar a realidade, por parte de um sujeito obcecado, que não gosta de ser chamado de “ditador”, apesar de ser o retrato mais vivo que temos à disposição.
Se a Venezuela se encontrasse do outro lado do oceano, num continente remoto, poderia compreender-se a frieza do governo brasileiro na abordagem dessa tragédia, essencialmente humanitária. Porém, os efeitos se materializam também em nosso país pela imigração descontrolada de milhares de pessoas desamparadas.
O Brasil já concedeu apoios morais e políticos, além de generosos aportes financeiros, que se transformaram em calotes de alguns bilhões de dólares, nunca cobrados e, ainda, premiados pelo silêncio e pela omissão, como a ponte sobre o rio Orinoco, de US$ 1,22 bilhão.
O Brasil dificilmente pode ocultar sua cumplicidade. Além de avais e financiamentos, a postura benevolente com os descalabros autoritários ampara e encoraja os despautérios dos ditadores bolivarianos.
E, se os vizinhos como o Brasil se tornam avalistas morais, as condenações que chegam de longe se enfraquecem.
A situação de derrocada do governo de Maduro, num país que já teve uma das maiores prosperidades do planeta, deveria sugerir aos governos do Brasil e da Colômbia, os principais países impactados, a iniciativa de discutir sanções contra Nicolás Maduro, forçando novas eleições, com fiscalização da ONU, e, em seguida, o restabelecimento de um governo democrático.
Deve-se ainda propor o financiamento internacional para a reconstrução econômica do país e o retorno ao berço natal da população.
A atual postura, marcada por omissão e velada cumplicidade, ajuda a consolidar a repressão num “banho de sangue”, quando, do contrário, poderia ser decisiva para o bem de milhões de venezuelanos.
É um absurdo, considerando que o Brasil, à procura de protagonismo internacional, vem sugerindo medidas no conflito ucraniano e não sabe dar conta da urgência e gravidade dos deveres de casa.