OPINIÃO

A dor do mundo

Pico della Mirandola, florentino excelso, iluminado, faleceu com apenas 31 anos, em 1494, e deixou o texto “Discurso sobre a dignidade do homem, que assim soa, bondosamente, aos ouvidos atentos

Por Vittorio Medioli

Publicado em 11 de junho de 2023 | 06:00

 
 
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
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Cumpre-se a ordem de publicar o texto de sabedoria, de autoria de um mestre, não importa a ele a divulgação do nome, alguém que já foi homem comum, atolado, como nós, num cotidiano de desafios e ilusões, de mágoas e traições, de amores e ódios, de lutas para colecionar números, atender vaidades, criar, assim, inimigos e no fim não saber explicar para que valeu tanto esforço de uma vida inteira. Passou por tudo e alcançou pelo conhecimento, pelas obras e pela devoção o melhor que está à disposição de um dos “filhos de Deus”. 

Eu sou a Luz Divina, e, se você deseja se casar comigo, deve estar disposto a sofrer a morte iniciática (morrer como individualidade e se sentir parte do todo), terá que passar pelas provas a que a terrível Esfinge (os quatro elementos) o submeterá, impiedosamente, para medir o seu valor espiritual e a qualidade de sua coragem.   

Eu me unirei com quem chegar à crucificação, resistindo aos ataques e tentações dos quatro elementos. 

Amo apenas aqueles que souberam tragar com humildade a taça inteira da amargura, da traição, do desprezo e da zombaria, da perseguição, da calúnia; aqueles que, carregando a cruz pesada, receberam coroas de espinhos e ofensas; aos iniciados que persistiram devotamente em sua essência divina, sofrendo, conscientes, a incompreensão, a solidão do espírito em meio a um mundo de ignorantes e animais. 

Tu, ó peregrino (das estrelas), chegarás a mim depois de ter passado por todas as experiências e tentações: as infâmias, que são os testes de Ar; os golpes das perseguições e traições, que são as provações da Terra; os vícios e as tentações sensuais, que são os testes da Água; e, depois de ter dominado as ambições e a sede de poder, que são os testes do Fogo. 

”Esse quaternário corresponde a cada uma das pontas da cruz onde pregaram um dos que se refugiaram no meu abraço: Jesus, o Cristo. No entanto, os seres humanos mais evoluídos viveram desconhecidos, apartados, e vivem em segredo. Ninguém sabe a sua existência porque, domados e aniquilados os desejos e a vaidade, assim compreenderam o que convém a eles”. Descobriram que a felicidade é um estado interno e sublime, uma contemplação e vivência da perfeição divina. 

Enxergaram que importante não é ter, mas é SER, e tu poderás ser comigo, depois de todas as provações, uma Luz Divina. Porque fiz a ti, pequena centelha, à Minha Semelhança para sustentar o Universo. 

Entendeste? Um dia precisarás sentir no teu âmago que “criados nós não fomos para viver como brutos, mas para seguir a virtude e o conhecimento”. Por essa via e com devoção, chegarás à meta. 

Aqui consideramos uma realidade: “Podem existir indivíduos, pertencentes à mesma raça humana e até à mesma família, que alcançam as alturas, enquanto outros irmãos se afundam nas profundezas. Paraíso e inferno, opostos de amor e ódio, de bondade e maldade, para testar, para dar oportunidade da ascensão que se adquire pelas chagas e pelos méritos, e pelo despertar da verdadeira consciência.  

Pico della Mirandola, florentino excelso, iluminado, faleceu com apenas 31 anos, em 1494, e deixou o texto “Discurso sobre a dignidade do homem”, que assim soa, bondosamente, aos ouvidos atentos:    

Não te concedi uma única face, nem um só lugar, ou algum dom que te faça particular, ó Adão, a fim de que tua face, teu lugar e teus dons, tu os desveles, conquistes e domines por ti mesmo. Sem impor-te natureza definida por lei, como obriguei outras espécies de seres vivos. E tu, ao qual nenhum confim delimita, tu, pelo teu próprio arbítrio, entre as mãos daquele que aqui te colocou, tu definas a ti mesmo. Te pus no mundo para que tu possas contemplar o que contém esta obra. Não te fiz celeste nem terrestre, mortal ou imortal, a fim de que tu mesmo, livremente, à maneira de um bom pintor ou de um hábil escultor, descubras tua própria forma. 

O céu estrelado vale a dor do mundo.