OPINIÃO

A insanidade nacional

Coluna do Vittorio Medioli: A insanidade nacional

Por Vittorio Medioli

Publicado em 06 de agosto de 2023 | 06:00

 
 
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
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Vittorio Medioli Vittorio Medioli
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É muito difusa a condescendência ao vitimismo. Às vezes, representa a única, monótona e oportunista saída do indivíduo que sabe nitidamente das suas culpas, da sua indolência, contudo prefere passar por inculpável, apesar de ser o direto responsável pela falta de resultado ou pela desgraça provocada. 

Na esfera pública o político, quase sempre sem resultado, pega carona nos sucessos dos outros, até cansar o eleitor e não se reeleger. Muitas vezes depois de ter infernizado e explorado o esforço para alcançá-los. Cinicamente, encobre o chumbo de suas mazelas com palavras de ouro. Só que ele conta mesmo com a falta de conhecimento e a miséria que o sistema nacional de educação lhe proporciona. 

São raras as atitudes de responsabilidade, de compromisso com a verdade nas relações sociais, profissionais e políticas. E sem esses alicerces não há como dar certo. Em solo podre não se erguem obras, apenas se afundam. 

Tem que interpretar mentiras, omissões, ocultamentos, simulações que provocam perdas imensas, não só econômicas. Retarda-se o alcance daquilo que já estava na hora de acontecer, deseducam-se com péssimos exemplos as novas gerações. 

A corrupção é o pior mal nacional, maior que a miséria e o sofrimento, pois é, de ambos, a principal causa. Em segundo, vejo o “empoderamento” que segue vias sórdidas e perversas. O “poder” pode se transformar em ganhos injustos e deletérios, “criando dificuldades para vender facilidades”. Esse vício remete cronologicamente ao “patrimonialismo”, termo adotado pela primeira vez por Sérgio Buarque de Holanda, em seu livro “Raízes do Brasil”, para descrever o “pecado original” de nossa nação. Atitudes dos mandatários que não identificam elementos de diferenciação entre o público e o privado. Disso mesclam-se os dois, colocando um a serviço dos outros, explorando-se pessoalmente o bem comum, que não chegará a seus legítimos destinatários: a população. 

Realiza-se, assim, uma inversão de princípios morais num atraso massacrante para o país e a população, notadamente a mais necessitada, aquela que espera, precisa e merece o “melhor” que a ela se possa dar, e não migalhas e esmolas. Os maiores recursos, ou a quase totalidade, em proporções até de 1 para 100, escoam em benefício de apadrinhados, sócios, parentes, corruptos, quadrilhas políticas até de fracassados, incompetentes e gatunos, sem o menor pudor. 

Os cargos não interessam apenas pelos salários que pagam, como no passado, mas pelo potencial de ganhos auferidos pela prevaricação e corrupção. 

Os interesses devoradores não deixam sequer um recurso atingir a real finalidade pública que o justifica. 

Nestes dias, como num passado recente, está se consumindo uma série de horrores, ou seja, estão se introduzindo os causadores que detonarão em breve o ambiente público e o deixarão ruir entre escândalos, como no passado. 

A nação necessita de um governo probo, eficiente, resolutivo e compromissado com a sustentabilidade de suas ações, a qualidade dos investimentos, o crescimento e a distribuição da renda. 

Por ignorância se desperdiçam as experiências de nações bem-sucedidas, num planeta já globalizado. Isso faz com que os erros sejam pagos amargamente. 

Provavelmente não se ouvirá de um político uma crítica à nossa inconsistência, ao “gigante adormecido”, que desperdiça o tempo e as oportunidades. Podemos analisar a lerdeza, o descompasso, a incompetência grosseira, ao par do fenômeno de empoderamento de setores de controle, que nunca produziram. Que desconhecem o básico, mas são cobradores de facilidades das imensas e inextricáveis complicações que geram. No Brasil quem faz a legislação não é quem produz, mas quem gera complicações refratárias ao resultado social e econômico, ao aumento da arrecadação pública, às oportunidades para a população. 

Vejam: em 2002 o Brasil produzia 167 milhões, e a Austrália, 176 milhões de toneladas de minério de ferro; em 2022 produzimos 346 milhões, e Austrália, 885 milhões, ou seja 539 milhões a mais que o Brasil. O nosso conjunto de legislação mefítica e os órgãos de controle entre os mais complicados do planeta não conseguem acompanhar a demanda mundial e estar prontos para o momento certo. Talvez a competência que lhe seja cobrada na nomeação seja para gerar dois tipos de desastres, uns como aqueles de Brumadinho e de Mariana, e outro que é deixar o Brasil perder uma receita colossal de trilhões de dólares, nos atrasos e na burocracia. A Austrália e o mundo agradecem! E o minério não é um caso isolado. 

A produção de aço, sem fomento do Estado, estagnou-se. Em 2002 produzimos 30 milhões de toneladas, e em 2022, apenas 34 milhões. Comparando-se com a China, que produziu 127 milhões e, depois de 20 anos, produz 1,01 bilhão de toneladas, o que deu? O Brasil cresceu em produção de aço 12% em duas décadas de complicações, aumentos tributários, empoderamento de inúmeros órgãos (que cobram pedágios), enquanto a China subiu 800% sua produção. A nossa ausência de competência premiou a China. 

A grata exceção é o agronegócio, com exclusão do setor de etanol. Este foi colocado em segundo plano pela priorização do petrolão (dos bolsos de políticos). Éramos o maior produtor mundial, e hoje os Estados Unidos produzem mais que o dobro do Brasil, justamente quando o etanol é de importância descomunal e aqui temos o maior potencial do planeta. 

O agronegócio é o setor produtivo (não por acaso) que sofre as iras e ameaças de alguns políticos. Nas últimas duas décadas a produção de grãos passou de 96 milhões de toneladas para 317 milhões (estimativa deste ano). Transformou-se na principal fonte de sustento da economia nacional. Entretanto, já poderia, com apoios, produzir 500 milhões de toneladas e ser o maior produtor do planeta. 

As gerações passam (a minha já era), e as esperanças de um país próspero e sábio ficam para trás, perdidas, como a nossa produção de aço, de etanol, de minério e até de esperança.