Vittorio Medioli

Vittorio Medioli

Empresário e político de origem italiana e naturalizado brasileiro, Vittorio Medioli é presidente do Grupo SADA, conglomerado que possui mais de 30 empresas que atuam em diversos segmentos da economia, como logística, indústria, comércio, geração de energia e biocombustíveis, além de silvicultura, esporte e terceiro setor. Estudou Direito e Filosofia pela Universidade de Milão. Em sua coluna aborda temas diversos como economia, política, meio ambiente, filosofia e assuntos gerais.

Vittorio Medioli

Ahamkâra

Ninguém nasce maduro, mas podemos sê-lo com o passar das estações

Por Vittorio Medioli
Publicado em 01 de janeiro de 2023 | 03:00
 
 

As pérolas que não enxergamos por estarmos obstruídos de preconceitos, ansiedades e metas ilusórias ou pura fome de vento ficam pelo caminho. O sábio que vem atrás percebe o desperdício. Nos últimos dias, aproveitei para rever e entender o que perdi por não ter captado o sentido nem enxergado a importância.

Percorri anotações de anos atrás, retalhos, livros engolidos rapidamente e rabiscados com observações. A releitura me permitiu lamentar o que perdi.

Ninguém nasce maduro, mas podemos sê-lo com o passar das estações.

Retornei a um livro escrito pelo “meu mestre”, que me presenteou no final de 1979. “Um diário de bordo” de sua experiência mística, guiada por quem mais sabia e via dentro das neblinas, atrás das montanhas e acima das nuvens.

Nas 313 páginas de "La Casa del Tramonto”, eu sou citado algumas vezes como um ex-aluno que chamava sua atenção, ao ponto de eu me tornar seu discípulo devotado até o seu retorno lá acima, ocorrido em 2003.

Recebi o livro encadernado com capa dura, em azul-marinho e com detalhes em ouro, há 43 anos, com euforia. De imediato, achei honrosas as citações, que me deram a sensação de alguma importância pessoal. Fui buscar com atenção apenas essas citações, folheando depressa e sem prestar a devida atenção ao conteúdo. Achei agora as colocações muito elevadas, sutis, herméticas e “underground” pelos meus parcos conhecimentos daquela época. Ele escrevia muito por intuição, precipitações, navegava em esferas que ainda hoje eu não alcancei. O tempo me aproximou, contudo, para sentir que existem, e um dia, quando o merecer, dominarei também.

Ele usava de conhecimentos oceânicos para elencar centenas de nomes de China, Tailândia, Peru, Nigéria, Polônia, Egito, Índia, Tibet, Rússia etc. O globo inteiro estava sob seu domínio cognitivo; ele o representava “a mando” de seus mentores e dizia que “ficarão claros no futuro” como registros de uma época densa de mudanças na humanidade.

A vida, dizia, é a procura do estado de consciência do que somos e não sabemos, inconscientes da imensidão da qual somos separados pelo  “Ahamkâra”. Um estado do ser “do nó que obriga o homem a esquecer sua realidade espiritual eterna” , o verdadeiro eu, e na passagem terrena se identificar, até o limite do aprisionamento à matéria, como fosse ela a realidade que conta. Disso ficar na jaula das ilusões materiais e passageiras de uma vida, de um corpo perecível, quando o espírito eterno se serve apenas por uma temporada de intensa experiência na matéria. Se o estado de Ahamkâra não criasse a ilusão de sermos apenas matéria, não avançaríamos nas experiências que são necessárias à evolução do espírito, do verdadeiro, do eu.

O livro é cheio de pérolas, ao ponto que estou pretendendo fazer um livreto, ou uma série de capítulos, dos pontos de sabedoria mais compreensíveis, remetendo à leitura do texto italiano para quem quer saber mais.

As páginas que ficaram na escuridão por 40 anos, hoje encontro-as com outro significado, profundo e revelador.

Ele de repente faz uma divisão das personalidades humanas, muito interessante, propondo um exemplo específico.

Diz: “Há três principais categorias de trabalhadores: aqueles que trabalham seguindo o sonho do bom patrão com alegria, confiança e serenidade são os idealistas, os mais afortunados, aqueles que perseguem resultados e emergem da opacidade; outro grupo é de pessoas que trabalham para ganhar, manter a família e satisfazer os seus desejos, são aqueles que costumam mudar de empresa, entendem o trabalho como um meio, não como um fim de sua atividade profissional; o terceiro grupo é de indivíduos de personalidade limitada, quase autômatos que trabalham porque o mundo inteiro trabalha, como parte de uma representação. Não enxergam a vida de outra forma. Assentam-se em suas funções como pedras de um edifício. São aqueles que preferem estabilidade, garantias. Quando se aposentam, costumam decair, frequentemente morrem, porque além do trabalho não têm outra identificação sustentadora na vida. Dentro desse grupo, temos aqueles que se lamentam de quase tudo, que encontram defeitos em quase todos, que não têm ação e apego para melhorar-se no desempenho.

No caso dos estudantes, os primeiros são os que querem fortemente aprender, amam o descobrimento do saber, não se queixam da dedicação e formarão no tempo certo os destaques da sociedade. Os segundos são os que estudam para ter proveito na vida, para ter um título, estudam calculadamente o imprescindível, acabam por ser peças de máquinas, não os propulsores. Os terceiros estudam o estrito fundamental, ou nem isso, não têm apreço pela leitura, procuram passar de ano sem valorizar a importância dos conhecimentos. Estarão sempre a reboque, de alguém, no último vagão”.

Ainda dele: “Qualquer coisa que tu faças, a ti será devolvida. Se perseguir o bem, encontrareis a felicidade; se escuteis o demônio, encontrareis a infelicidade. A verdadeira felicidade está em vós, dentro de vós flui o oceano do néctar divino”.

Feliz ano novo!