Opinião

Ano de 2100

Depois de se descarbonizar e despoluir o meio ambiente e as águas, surgirá um movimento ainda mais grandioso, voltado a desintoxicar o ser humano, física e mentalmente

Por Vittorio Medioli

Publicado em 27 de agosto de 2023 | 03:00

 
 
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
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Mudança é uma alteração, uma troca, como ocorre no endereço, no número do telefone, no carro que usamos.

Já a mutação é um passo à frente na evolução, é o alcance de um novo estágio, deixando atrás outro, ultrapassado. É a borboleta que sai da crisálida.  

As mudanças são repentinas e normais; as mutações, mais lentas, raras e transformadoras. Já houve épocas e séculos sem mudança alguma. Neles se alternam quatro ou mais gerações andando a cavalo, navegando em barcos e navios de madeira, aquecendo casa e comida com a queima de lenha, com alterações imperceptíveis.

As últimas três gerações, de 1950 até hoje, assistiram a avanços extraordinários, não apenas tecnológicos, mas ainda comportamentais, como nenhuma geração ao longo de milênios teve a possibilidade de viver.

Ninguém sequer imaginava um notebook, um smartphone, um carro elétrico, um drone de R$ 500 voando livremente. Viajar para outros continentes e voltar em poucos dias, ter geladeira, televisão, conectividade, videochamada para o planeta inteiro sem gastar um centavo.

Minha geração pode lembrar a realidade da década de 1950 e o que é agora. Constatam-se tantos e tão profundos avanços transformadores na vida comum, nas relações sociais e na ampliação impressionante de horizontes nunca imaginados.

O homem, de cidadão de um Estado, passou à categoria de habitante de um planeta, do mesmo meio ambiente de qualquer outro ser. Entende que ainda não se converteu em ser cósmico, contudo não tem dúvida desse destino.

Se na década de 1950 era impossível imaginar o nosso nível de evolução na terceira década do novo milênio, o que podemos pensar em relação à vida que aguarda a humanidade da última década deste século? Será a vida de quem nasceu ultimamente e chegará lá em condições muito mais preservadas do que aquelas de um septuagenário atual.

Alguns indícios sugerem que o homem trabalhará muito menos, terá mais tempo à disposição para seu lazer, sua prática de esportes e exercícios, estará mais descrente da materialidade e mais interessado nos aspectos culturais e espirituais. A Era de Aquário, cantada e badalada pela New Age, estará consolidando tendências, preferências e interesses de uma humanidade que terá superado o lado primitivo da violência, da competição e da guerra.

A prática de yoga, apesar de milenar e restrita, será a fórmula mais adotada pela humanidade desperta, não apenas nos aspectos físicos e nitidamente secundários, mas para ativar as potencialidades latentes do homem, tão portentosas, que serão fator de escalada aos vértices profissionais, políticos, intelectuais e artísticos.

Depois de se descarbonizar e despoluir o meio ambiente e as águas, surgirá um movimento ainda mais grandioso, voltado a desintoxicar o ser humano, física e mentalmente. Será acelerada, assim, uma mudança econômica e de todas as relações comerciais, para uma esfera revolucionária e pouco descritível agora, do ponto de partida cultural dessa década.

Hoje a nossa economia, além de ser movida prevalentemente por energias sujas, é movimentada pela toxicidade dos alimentos, dos fármacos, dos materiais que fazem parte da nossa higiene, que são mesclados às águas que bebemos, aos materiais que são lançados nos oceanos e ao artificialismo onipresente.

Se a conversão energética tem uma importância colossal, apesar de não se vislumbrar ainda a extensão dela, a desintoxicação ou descontaminação dos mercados, dos alimentos, da química e de tudo possibilita mutações econômicas drásticas, nos fluxos de dinheiro, de valores, e a queda de impérios financeiros que não souberem se renovar. A drasticidade será compreendida mais adiante, depois de ultrapassar algumas esquinas.

Certamente os balanços de emissões de carbono terão uma importância fulcral nas próximas duas décadas, mas em seguida mais importância terão os balanços de toxicidade das atividades econômicas. Ouso dizer que, como temos títulos de sequestro de carbono, teremos adiante títulos de eliminação de tóxicos que contaminam a humanidade e a adoecem.

Isso terá reflexo nas atividades de produção de alimentos,  médicas, de seguridade, cuidados de saúde, moda etc. 

Pode-se supor que os seres humanos adoecerão menos e se desligarão do corpo envelhecido quando sentirem essa necessidade, para ter acesso a outras esferas.

É permitido crer que o fim do tabagismo será seguido pelo fim do álcool, de inúmeros medicamentos, das carnes, dos alimentos de origem animal, dos conservantes, dos corantes, dos produtos químicos nocivos. Os alimentos, além de naturais, serão orgânicos. Os provenientes da natureza e da selva terão uma procura e um valor fantástico.

Novos conhecimentos gerarão novas regras, seguidas por uma mudança dietética radical. Isso já começou a se acelerar, e se constata na proliferação do veganismo um salto além do vegetarianismo, que admite laticínios e ovos.

Pessoalmente, vivi essas experiências de evolução de dietas e me arrependo apenas de não ter assumido o veganismo há mais tempo. Não é uma mudança forçada, que deixa saudades. Ela ocorre juntamente ou decorrente de uma mudança interior. De uma consciência que se dilata e faz ver e sentir em cada ação, e em detalhe, os efeitos que desencadeamos e as sementes que plantamos.  

O veganismo desanuvia quando assumido “naturalmente”, limpa a forma de pensar, raciocinar e de agir. É um ganho de sabedoria, de lucidez, de vidência. Não tem retorno, se passa depois disso a ver claramente quantas e fantásticas oportunidades deixamos de aproveitar. 

Haverá turbulência; o mal, como sempre, tentará se opor ao bem, como o ar força fisicamente as asas do avião a levantá-lo para o céu.