Um ser humano se torna líder de homens ou famoso em círculos mais amplos e apercebe-se, muitas vezes, tomado de um poder que vem de fora, além de suas forças humanas e egoísticas. Ele pode perceber, quando minimamente desperto, um destino maior que age por meio dele, como uma vontade misteriosa e insondável; uma luz interior de grande brilho agindo para encaixar com êxito as peças de um enorme quebra-cabeça, por meio de escolhas guiadas.
Seus pensamentos, suas ações ou seu gênio criador passam a conseguir resultados por vezes formidáveis.
Entretanto, pessoas nesse estado de possessão superior efetuam destruições formidáveis, erupções de eventos, que facilitam o caminho da humanidade, removendo o que é obsoleto ou, ainda, conseguem alguma grande construção, inovação, que se torna o lugar de repouso e felicidade de multidões.
Essas pessoas, atores do destino, externamente podem parecer um flagelo (fazendo o mal) ou portadores de luz e de cura (realizando o bem), criadores de beleza e mensageiros de conhecimento. Passam a trabalhar com a sensação e a percepção muito viva de serem instrumentos eleitos para essa missão ou obra portentosa.
As pessoas que têm esse destino e esses poderes momentâneos creem facilmente – e declaram – que são meros instrumentos nas mãos de Deus, do Destino Supremo, mas muitos, frequentemente, em suas expressões, demonstram um egoísmo mais intenso e exagerado. Essas pessoas podem perder-se pessoalmente; falam de Deus abusivamente, para gerar uma imagem deles próprios como “ungidos” e infalíveis, portadores de luz que não lhes pertence, mas apenas lhes foi emprestada para um escopo determinado e passageiro.
Essa imagem magnificada de seu ego não serve para alcançar um objetivo maior, mas está à procura apenas de outros mesquinhos e pessoais. Disso advém a desgraça, que vem de costume com a falta de humildade. Prelúdio de falência, pois, ao entrar numa obra egoística, o mecanismo emperra.
Isso é o que acontece com frequência com aqueles que têm uma natureza vital forte, mas grosseira, ou mentes que se exaltam com facilidade quando permitem à ambição, ao orgulho ou ao desejo de grandeza introduzirem-se e viciarem a pureza de seu propósito.
Uma egolatria magnificada interpõe-se e apodera-se do seu comportamento para fins pessoais; o divino que agia por meio dele se afasta inexoravelmente. Percebe-se que uma força maior que a pessoal de ser humano comum cessa. Traí-la é suficiente para que o encanto se desfaça.
Essa sensação de um poder maior, exclusivamente nosso, é uma alucinação ou megalomania. Aqueles que são conscientes dele têm uma visão mais vasta da essência humana comum, diferente daquela evoluída. Deram um passo mais além, da inteligência que serve para sobreviver, quase animalesca; possuem uma visão desse poder das esferas espirituais e vitais mais sutis.
Esses aspectos antagônicos na ioga (ensinada por Aurobindo) são faces de um destino em que o mal vem para o bem, e o bem por si só tem que ser fruto de uma elevação de consciência que nos coloque a serviço e em harmonia com os desígnios superiores, e não meramente pessoais e de pouca utilidade.
A natureza material é imperfeita e falível, encobre o potencial imenso que cada ser humano é. Oculta a existência de um espírito que desceu na matéria para se exercitar e se engrandecer, esquecendo quase sempre que ele é uma parte de um Todo indivisível, aparentemente dividido.
Então, o sofrimento chega, sem compreender a vastidão – pior: se apegando a um poder tirânico ou demoníaco do mal (que, afinal, serve para redirecionar ao bem).
Para este ser, um Ulisses, a escolha do destino pode ser completamente clara – e isso dará um grande proveito – ou obscura – e a pouco servirá.
Ter consciência da diferença entre conhecimento e ignorância é uma graça para ser merecida. O sopro do poder divino vai aonde quer para realizar algo que serve à evolução.
(O texto segue o ensinamento de Aurobindo, iluminado hinduísta, fundador de Auroville, no Sul da Índia).