A compreensão confusa e impura se dá pelo desejo pessoal nas funções do pensamento. “O próprio desejo é uma impureza da vontade” no ser humano, diz o sábio, que se envolve nas partes vitais e emocionais de nossa existência.
Quando os desejos e as emoções interferem na vontade de saber, de conhecer, ou seja, de praticar o que pode engrandecer o homem, a função do pensamento se torna involutiva e não persegue os objetivos melhores, mas o que lhe é ditado de baixo, não onde aponta a evolução.
Com os desejos soltos, as funções ideais se encontram obstruídas, perturbadas, deformadas. Parciais e quase cegas, desrespeitam as condições objetivas da profícua convivência social.
A compreensão deve elevar-se para além do assalto dos desejos e das emoções pessoais, para haver uma perfeita imunidade de escolha. Entretanto, é, hoje, uma prerrogativa rara, própria de seres “santos ou iluminados”.
Apenas com emoções purificadas se pode escolher melhor, sem deixar passividades, prejuízos, dores, sofrimentos, desconfortos, invejas e perturbações no rastro. Deveria ser esta uma atitude básica do homem público e do político, pois todos, sem exceções, intitulam-se como pessoas dedicadas a uma sociedade melhor.
Apenas com pensamento descongestionado se respeitará o que está em volta; isso serve para evoluir para estágios mais avançados, e até sublimes, de qualidade de vida e motivação, livres dos instintos atávicos e de sucesso a qualquer custo.
Os desejos são humanos e necessários, mas, depois de se atingir certa maturidade devem ser domesticados, postos a serviço de todos, e não deixado donos de uma festança lasciva.
Serviram para conduzir os primeiros passos, para determinar a sobrevivência, mas, como uma roupa velha e cafona, serão deixados para vestir indumentos mais apropriados.
O ser humano deve esforçar-se para se livrar das emoções toscas, como medo, cólera, ódio, luxúria, ócio, brutalidade, egoísmo, que constituem os principais desvios da personalidade, deixando ainda a compreensão presa nos grilhões da parcialidade.
A tranquilização e o controle desses elementos do comportamento são uma condição basilar para livrar o intelecto de miragens e de erros tristes.
Em nossos dias parece utopia, ou devaneio, escrever essas coisas, mas a purificação da nossa vida, dos nossos pensamentos, o compromisso em ser úteis implicam uma pacificação dos sentidos. Isso abre as portas e janelas para o conhecimento, a verdade e, consequentemente, as escolhas e os gestos melhores para a sociedade e para o próprio indivíduo.
O desejo foi o que tirou Adão do Éden, é uma condição primordial da evolução humana, entretanto leva ao sofrimento. Justo seria domesticá-lo para deixar de ser um cavalo selvagem e passar a ser um puxador de carroça.
Esses princípios levam a imaginar a superação do sofrimento, dos desejos infindáveis, que obscurecem nossas escolhas e aviltam nossas relações.
Ora, se permanecer meia hora nas redes sociais, será possível avaliar a obtusidade que aflige ainda a humanidade, não apenas por aquilo que apronta, mas pela maneira de usar, interpretar, espalhar informações de total parcialidade, que acabam ofuscando até as poucas verdades, que se misturam a essa avalanche de horrores.
Se analisarmos o conteúdo dos debates políticos atuais, encontraremos pouco que presta. Confrontamos reiteradas distorções da realidade, ofensas aos adversários, verdades violentadas, que são fundamentalmente o ponto de partida das boas escolhas.
O que tem de bom é que as redes e muitos de seus atores exaltados e facínoras perdem a cada dia a credibilidade; a fama que os brindou evapora no descrédito. E, para alguns, os mais possuídos de maldades, sobrará um futuro incerto, com processos por ofensas, calúnias e infâmias que deixaram no rastro.
“Mens sana in corpore sano”, dos antigos romanos, continua sendo um conselho poderoso para estarmos em paz com todos.