Vittorio Medioli

Vittorio Medioli

Empresário e político de origem italiana e naturalizado brasileiro, Vittorio Medioli está em seu segundo mandato como Prefeito de Betim. É presidente do Grupo SADA, conglomerado que possui mais de 30 empresas que atuam em diversos segmentos da economia, como logística, indústria, comércio, geração de energia e biocombustíveis, além de silvicultura, esporte e terceiro setor. Estudou Direito e Filosofia pela Universidade de Milão. Em sua coluna aborda temas diversos como economia, política, meio ambiente, filosofia e assuntos gerais.

O TEMPO

O inelegível

O principal representante da “direita brasileira só poderá voltar à cena política no alto de seus 76 anos

Por Vittorio Medioli
Publicado em 02 de julho de 2023 | 08:57
 
 

Jair Bolsonaro recebeu do sistema que desafiou a condenação que “mereceu” por várias razões. Seu governo, de fato, incomodou. Não foi bom para o mecanismo que explorava o país com obras públicas descomunalmente superfaturadas, juros escorchantes, expropriações cartoriais de renda popular, carga tributária doentia e o tal patrimonialismo, que representa o tumor colonialista do qual o Brasil continua escravo.   

Perdeu entre os eleitores de regiões com Índices de Desenvolvimento Humano piores, entre as mulheres e, principalmente, no Nordeste. Ganhou em quatro das cinco regiões geográficas, com uma plataforma que já almejava uma máquina estatal mais enxuta, mais eficiente e voltada a prestar apoio à população, e não dificuldades incessantes por meio de uma burocracia predatória e excludente, que mantém o país atrasado.   

Faltou-lhe cerca de 1% dos votos, assim decretou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Judiciário que Bolsonaro ousou contestar, pedindo-lhe abertura dos códigos-fonte das eleições que disputara. Não foi atendido, e o gesto, acompanhado de alguns exageros em seu discurso, transformou-se no principal motivo para deixá-lo inelegível por oito anos.  

Assim, o principal representante da “direita” brasileira, que cobra austeridade, redução de impostos e liberdade econômica como forma de atingir a prosperidade de toda a nação, só poderá voltar à cena política no alto de seus 76 anos. 

Mas o governo de Bolsonaro, apesar dos imensos conflitos ideológicos que ofuscaram os resultados práticos de sua gestão, representou melhorias significativas nos repasses de verbas para a saúde pública e a educação. O ex-presidente, agora impossibilitado de disputar novas eleições, também nunca acenou com aumento de tributos, taxas e outras alíquotas. Descomplicou, reduziu milhares de empregos públicos, diminuiu despesas e atacou desperdícios. Fez aquilo que os outros governos não conseguiam, pois se sustentavam em apoios políticos “comprados” com ministérios, estatais e outros cargos. 

É certo que Bolsonaro não mediu o perigo, cutucou onças com vara curta, tirou o osso das mandíbulas das feras e desafiou os donos dos sistemas bancários e financeiros. Deu para população um Pix, no lugar de operações que rendiam bilhões para quem sempre financiou campanhas eleitorais. Desmantelou, para proveito até do atual governo, o mecanismo das 13 empreiteiras que ditavam a lei e abasteciam partidos e campanhas, elegendo grande parte do Parlamento e a grande maioria de cargos majoritários. 

O ex-presidente fez aquilo que precisava, mas que ninguém tivera a coragem de fazer por questões ideológicas, compromissos inconfessáveis ou narrativas demagogas. Oxigenou a economia, mas contrariou o interesse de quem submetia o país ao jugo da espoliação, das dívidas e de acordos indecentes. 

Desafiou, apesar de não ter tomado atitudes práticas, o poder mundial, o “poder brasileiro” e tudo aquilo que era temido por antecessores. Enfim, um incômodo e uma ameaça séria para quem ganhou, por séculos, fortunas em tantas outras “boas fases” do país e, mais ainda, por meio de sucessivas crises do Brasil. 

A soberania nacional esteve em evidência. Mas a quem interessa um Brasil “soberano”? Oficialmente, ao mundo inteiro, mas, atrás do balcão, a quase ninguém. E soberania é uma questão de atitude, que constrói a independência econômica, garante peso nas relações internacionais e diminui a dependência.  

Bolsonaro, ao se eleger sem partido e sem financiamento público, com poucos gastos, mostrou que poderia vencer sem precisar do sistema. Poderia ter evitado tal desfecho com falas mais comedidas, distribuindo favores, verbas e, novamente, concedendo os famigerados cargos. Poderia, também, ter evitado o confronto direto com as elites, que influenciam a opinião e que, ainda, detêm as rédeas do poder. Não fez nada disso e recebeu a sentença. 

Ele inovou, sacudiu um país em decadência, fez inimigos ferrenhos e, melancolicamente, vê-se, agora, destituído de seus direitos políticos. Também seus eleitores, cerca de 58 milhões de pessoas, perderam o direito de votar nele. E muitos destes desconfiam que se elegeu por sorte, com ajuda dos deuses, em decorrência de uma facada que despertou a massa eleitoral da sonolência. Paradoxalmente, o sonho de quem o idolatra se apaga; desta vez, por meio de outro tipo de “facada”, que, dizem, não custou sequer uma única gota de sangue.

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